Sabes, quando aterrei em Angola em Setembro de 2015 tinha na minha cabeça uma data de ideias pré-concebidas sobre africanos, africanas, sobre o seu modo de vida, a sua cultura, as suas crenças, sobre o que priorizam e o que consideram supérfulo, sobre como vivem a familia, o casamento, os filhos, os pais, a sua ideia de comunidade, as suas ambições profissionais e pessoais.
Ao fim de um ano e 3 meses a viver em Luanda e a conviver diariamente com angolanos - adultos e crianças - concluo que muitas das minhas ideias pré-feitas não tinham qualquer fundamento lógico. Outras tinham fundamento mas pelas razões erradas. Outras ainda, continuo a tentar perceber onde raio é que fui buscar lógica para justificar essa bagagem moral que tinha na minha cabeça, porque não se enquadra minimamente na realidade, na realidade que observo, in loco, todos os dias.
Sei que há angolanos, de gerações antigas e mais jovens, que não gostam da presença do português em Angola. E compreende-se perfeitamente: apesar de eu já ter ouvido da boca de algumas pessoas - portuguesas pois claro - que no tempo anterior a 1975 é que os nativos tinham uma vida melhor, a realidade é que isso era válido apenas para uma percentagem muito infima da população angolana. A restante população não tinha essa oportunidade.
Sei também que há angolanos para quem a presença do português é bem-vinda, pois traz saber-saber e saber-fazer. E isso vale muito para ajudar o País a crescer.
E depois há os angolanos que superficialmente não ligam nada se eu sou branca, amarela ou rosa às pintinhas. Saliento: superficialmente. Pois eu, copo de leite , nunca passo despercebida. O que já não me deixa muito desconfortável.
(não muito, só um pouquinho...)
Desde que aterrei em Angola também assumi logo no inicio que eu tinha uma responsabilidade: demonstrar, através dos meus actos, da minha postura, dos meus principios e da minha educação, que não represento o que de mau se fez no passado pelos nossos antepassados portugueses.
E podes perguntar-me se isso será justo para comigo ou se cabe a mim fazê-lo. Eu respondo-te que sim.
É justo porque eu tenho essa herança assumida na minha pele e na minha nacionalidade de nascimento. E cabe-me fazê-lo, assim como acho que cabe a todos os outros como eu que estão nesta linda terra, nesta maravilhosa e fervilhante terra que os acolheu - que apesar de tudo os acolhe sempre! - para mudarmos ideias pré-concebidas: as minhas, as dos meus filhos, as do angolano que comigo se cruza no supermercado, do filho dele, da mamã(*) que me vende a fruta na rua, do companheiro de carteira da minha filha do meio, dos portugueses mais novos do que eu que aqui estão a trabalhar mas que vivem numa redoma, fechados nos condominios onde vivem e a frequentar socialmente sitios onde apenas vão maioritariamente outros portugueses... enfim, mudar a partir da base algo que é estruturante e corrosivo em toda a sociedade.
E não preciso de fazer nada de especial para algo tão profundo. Apenas tenho de ser eu. Apenas tenho de agir normalmente no meu dia-a-dia com a educação, gentileza e valores morais que possuo. Ver a pessoa e não a raça. Ver o coração e não a cor da pele. Só isso. Fácil, não?
Dou-me conta que ainda não te falei sobre o que me trouxe aqui, o titulo deste post.
Ou se calhar tenho falado nele desde o principio: é que desde que aterrei em Angola, uma das ideias pré-concebidas que tinha na minha cabeça é que a forma de amar de uma mãe africana continha diferenças substanciais em relação à forma de amar da mãe europeia. Errado, totalmente errado.
Os cuidados de saúde tal como os conhecemos na Europa são infelizmente uma miragem para muitas mães angolanas. Desde que conheço essa realidade de perto, nunca mais me queixei do tempo de espera num centro de saúde ou num hospital em Portugal. Porque apesar da espera, eu tenho acesso a profissionais de saude, a medicamentos - alguns deles a preços baixos - e a condições sanitárias boas. Em Angola isso ainda está a ser construido para todos usufruirem.
Mas estas diferenças fundamentais não afectam em nada a forma como uma mãe angolana ama os seus filhos. Porque ela ama-os incondicionalmente como eu amo os meus filhos, ela mima-os tal e qual como eu mimo os meus, ela preocupa-se com o seu futuro tal e qual como eu me preocupo com o futuro dos meus.
Angola tem-me ensinado muito, não me canso de o dizer. Sei que tudo o que eu possa deixar como contributo nesta terra, vou receber dela o triplo, no minimo: crescimento emocional, maturidade, conhecimento, enriquecimento cultural... e mais pedacinhos do meu coração oferecidos.
Acho que já te disse isto e de mãe para mãe: irias gostar tanto de visitar esta terra...
(*) mamã: mulher já na casa dos 50 anos, normalmente já com filhos e netos. Respeitada pela sua idade e posição na familia. Chama-se "Mamã" por ser a cuidadora da familia.